domingo, 15 de setembro de 2024

Libações (primeiras); Beauvoir

   [alcançada a p. 321, na quinta, à tarde, na Luz]

RECORTE(s)

     Não fomos ao cinema. Jacques levou-me ao Stryx, na Rua Huyghens, onde era freguês [...] Ele chamava o criado pelo nome, Michel, e pediu para mim um Martini. Nunca pusera os pés num café e eis que me encontrava à noite num bar, com dois rapazes: para mim era realmente uma coisa extraordinária. As garrafas de cores tímidas ou violentas, as tigelas com azeitonas ou amêndoas salgadas, as pequenas mesas, tudo me espantava [...] Engoli rapidamente o meu cocktail e, como nunca bebera uma gota de álcool, nem sequer vinho, de que não gostava, depressa levantei os pés da terra. Chamei Michel pelo seu nome e expandi-me. [...] Eu falava com os clientes, que eram uns nórdicos jovens e calmos. Um deles ofereceu-me um segundo Martini, que, depois de um sinal de Jacques, despejei atrás do balcão. Para estar à altura, parti dois ou três copos. Jacques ria e eu sentia-me nas nuvens. Fomos ao Vickings. [..] Ensinou-me o póquer de dados e pediu para mim um gin-fizz com muito pouco gim: eu submetia-me amorosamente à sua vigilância. O tempo não existia: já eram duas horas, quando bebi, ao balcão da Rotonde, uma menta verde. À minha volta esvoaçavam rostos surgidos de outro mundo; havia milagres em todas as esquinas. [...]

[sublinhados acrescentados]

Simone de Beauvoir (1908-1986), Memórias de uma menina bem-comportada (1958), 2023, pp. 312-313

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