[…] E sendo o calor
tanto, vão-se refrescando os assistentes, com a conhecida limonada, o geral púcaro de água, a talhada de melancia, que não seria por irem morrer aqueles que se consumiriam
estes. E se o estômago pede recheio mais substancial, não faltam aí os tremoços e os pinhões, as queijadas e
as tâmaras. El-rei, com os infantes
seus manos e suas manas infantas, jantará na Inquisição depois de terminado o
acto de fé, e estando já aliviado do seu incómodo honrará a mesa do
inquisidor-mor, soberbíssima de tigelas
de caldo de galinha, de perdigões, de peitos de vitela, de pastelões,
de pastéis de carneiro com açúcar e
canela, de cozido à castelhana com
tudo quanto lhe compete, e açafroado,
de manjar-branco, e enfim doces
fritos e frutas do tempo. Mas é tão sóbrio el-rei que não bebe vinho, e porque
a melhor lição é sempre o bom exemplo, todos o tomam, o exemplo, o vinho não.
José Saramago, Memorial do Convento, 51.ª ed., 2011, pp. 65, 66
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